terça-feira, 22 de julho de 2008

Impressões

Ainda sinto as paredes se fechando sobre mim. São como reticências que ficaram perdidas no canto de uma página esquecida. O quarto escuro, a dor lancinante atravessando todas as arestas do corpo, como se me fosse penetrar pela alma dentro. Frêmitos causticaram minha nuca quando senti o sibilo seco das pontas do chicote(sim, PONTAS) que me tocavam, e a mão que os guiava, (se é que havia uma mão, pois as vezes chego a pensar que isso tudo não passa de uma criação mórbida de minha mente doentia), era calma e hábil, movimentos leves e metodicamente premeditados. Havia pouca luz, mas o bastante para me deixar completamente aterrorizado ante a visão que se desenhava à minha frente. Aquele porcino sorriso...Os ferinos olhos...A pálida textura do colo desnudo...A pele, de uma rigidez invejável, brilhava como se tivesse sido embebida em óleo. Só não brilhava mais que o par de botas, altas, pretas, pesadas, que pareciam inocular em meu coração um veneno capaz de me elevar a patamares altíssimos de corrupção e blasfêmia. Não conseguia desviar o olhar das botas. O contorno delas, o bico finíssimo, o insalubre salto, o zíper que as envolvia, colando-as às pernas de cima a baixo. Havia um leve odor de éter no ar, as velas queimavam lentas nos castiçais, como se já nem queimassem, estivessem congeladas num não-lugar fora do tempo e do espaço, bem como toda aquela maldita alcova. Mas o pior de tudo era o silêncio. A não ser pelo estrídulo som que o chicote produzia quando ela o sacudia, não havia som algum, interno ou externo. A única coisa que eu ouvia era minha ofegante respiração. "Não sei porque me deixo levar por essas tuas loucuras", ela disse."Sabes que não é de coração que o faço". Para mim, isso pouco ou nada importava.Vê-la ali, daquele jeito, parecendo a própria Catarina II, mergulhada numa aura de crueldade e arrogância, era o meu paraíso particular. Eu poderia trancá-la naquele quarto, fazer dele um templo em que lhe renderia homenagens diariamente, beijaria seus pés sagrados e admiraria com uma volúpia ultra-sensual o seu maravilhoso e impávido corpo. Se tivesse tal poder, a tornaria uma estátua de pedra, imóvel, imortal, soberana e, principalmente, minha. Não se tratava de domínio. Antes ela que me dominasse. Pois eu era dela, lhe pertencia, era seu soldadinho de chumbo, pronto para me dobrar à todas as suas vontades, nem que isso significasse ser atirado na lareira e lentamente derreter nas cálidas chamas.
Porém a minha queda estava apenas começando...

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