quarta-feira, 23 de julho de 2008

O Primeiro Poema

Lembrei-me da música do Velvet Underground...Na verdade, lembrei várias coisas, umas que queria lembrar, outras nem tanto. Foi um dia de lembranças...Lembranças da noite passada. Ainda havia um pouco dela em mim. Ultimamente, muito dela havia em mim, e, na verdade, não gostava muito dessa idéia. Não gostava mas nada podia fazer. Eu soube, do momento em que a vi sentada no solar daquele jardim, numa tarde cinza de outono, que ela era a minha Vênus, tal qual Wanda para Severin, no romance de Sacher-Masoch. Naquela tarde, fui para casa e me torturei, física e espiritualmente, na vã esperança de que isso me fosse acalmar. Jamais seria o mesmo após tê-la visto. O que se seguiu foi uma volta à intelectualidade racional, ainda que por dentro eu estivesse completamente histérico, tremendo como um cão acossado pelo frio. Mas, bem como nas mulheres a histeria se manifesta em gritos e convulsões virulentas, em mim tudo termina em silêncio e versos. E foi isso que escrevi:

A princesa
Raios de uma intermitente luz
Tocam em teus cabelos espraiados de eu tanto os olhar,
A tua boca espalhou pelos jardins um perfume que
Transmutou em Hora os viços das alamedas...
Derramaram nos pórticos um almíscar já em mim
E fora, e para dentro das praias cruzaram ondas
De brisas trazidas por sinos de catedrais de lá longe,
E a tua voz abriu árias para esteiras que não há.
Tão abstrata se desenhou em mim dentro a tua idéia de voar
Como asas que planaram ágeis, pousadas paralelas
Em cruzes todas ouro de vielas de além-sonho...
Correram em teu corpo ninfas espectrais, e na minha alma
Se ergueram palcos para peças que ficaram por representar.
Criaram relvas externas ao teu redor,
E há agora nuances de teu existir em meu habitar.
Os dias passaram pelas hastes dos ventos,
Cobriram de agora os meus cantos escuros, muitos,
E que quero eu da prudência que me guarda,
Que de mim é este espalhar de sentires que vejo,
Se me é estranha a caravana em teu sorriso que há?
Deitaram farsas que soaram falsas aos ouvidos;
Misérias que foram ter co'as parcas, sombrias costureiras...
E o meu sentir-te é uma tristeza que me quiseram
Engolida,
No teu caminhar ferino que passou de lado a lado em minha alma...
Adentraram ondas de mares pintados pelos teus braços...
Rugiram feras ao acaso, desmaterializaram portões de átomos de ferro...
Árvores se ergueram frondosas em bosques nas passagens
Tão metal...
Essências banharam néctares nas musas que hão-de-vir.
E o teu suspiro é uma musa imantada pelas raspas dos ventos
Irrelevante devaneio de volúpias que se quis louras, cristalizadas
Por archotes de crepúsculos evocados em cânticos fora de lembrar.
A tua lembrança me ocorreu fundida por imagens nevoentas
De pântanos lodosos todos Hera,
E bateram por trás das casas vizinhanças vindouras
De quartos pretos onde os habitantes não residiram...
Curvaram estradas na minha percepção horizontes...
Acima de muros estreitados em braços róseos altivos de se tocarem.
Canções que se ouviram de orquestras aprisionadas em esquifes
Sorriram nos lábios de múmias das latitudes de lá;
Não sorriram seixos de assombros já antigos, ergueram monumentos
Às deidades impolutas dos pensamentos que há...
E há cordões nas varandas enroscando os céus de hálitos
Amendoados...
Passaram alados traços de relvas nas selvas de tempestades que surgiram,
E o teu passante olhar que se cruzou nos trilhos de trens que nem vi...
Ah poder tocar-te sem sequer tocar-te!
Ah descobrir além de ti o Universo que me inventaram...
Ah o Diabo que carregue isso tudo!
Poema Interseccionista...

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